LOGOMARCA DO ATELIER DE ARTE E RESTAURAÇÃO

LOGOMARCA DO ATELIER DE ARTE E RESTAURAÇÃO

terça-feira, 24 de junho de 2008

PATRIMONIO

PATRIMÔNIO
Imagens da fé renascem na mão de restauradores
Paulo Filgueiras/EM/D.A Press
Josiane Figueiredo, coordenadora da recuperação, destaca que meta é renovar as relíquias sem alterar nenhuma característica: respeito aos devotos
Itabirito – A expectativa pelo retorno é grande, mas vale a pena esperar. Com paciência e uma dose de ansiedade, os moradores dos distritos de Acuruí, São Gonçalo do Bação e Bonsucesso, em Itabirito, a 55 quilômetros de Belo Horizonte, aguardam o término da restauração de 23 imagens barrocas de suas igrejas e capelas. As peças, que incluem um raro São José de Botas, apresentavam uma série de problemas, como ataque de cupins, perda de madeira, trincas e rachaduras, sendo conduzidas a um ateliê, na capital, para imunização e outros serviços de conservação. No próximo mês, duas delas devem voltar aos seus altares de origem, ficando o restante para ser entregue em dezembro.

Enquanto os objetos de devoção não voltam aos distritos, os moradores não perdem tempo e visitam o ateliê da empresa Acervo para ver o andamento dos trabalhos e matar a saudade. “A nossa fé é muito grande e quero ver as imagens bem bonitas”, diz Oliveira Maria dos Santos, de 57 anos, moradora de São Gonçalo do Bação, a 14 quilômetros da sede do município. Ela gostou do que viu e garante que o importante é a preservação do patrimônio por meio de cuidados permanentes. Da Igreja do padroeiro, foram enviadas para BH as imagens de Nossa Senhora das Dores, Senhor dos Passos, Cristo Morto, São Gonçalo do Amarante (duas imagens), Nossa Senhora do Rosário e São José de Botas. Já da paróquia de São Sebastião, seguiu uma escultura de Santo Antônio.

A restauração está sendo feita, desde fevereiro, graças a um projeto da Divisão de Memória e Patrimônio da Prefeitura de Itabirito, que obteve recursos de R$ 53 mil do Fundo Estadual de Cultura/Secretaria de Estado da Cultura, R$ 44 mil do Ministério da Justiça, e R$ 8 mil da prefeitura. O secretário municipal de Patrimônio Cultural e Turismo, Ubiraney de Figueiredo Silva, diz que, além da preservação dos bens, o trabalho representa uma ação de educação patrimonial e fortalece os laços da comunidade com a sua história.

No distrito de Acuruí, a 24 quilômetros da sede do município, todos comungam da idéia de que a restauração é fundamental. “É preferível esperar o tempo que for preciso do que ver o nosso tesouro se deteriorando”, afirma a secretária da associação comunitária local, Sirvani Pena, de 40. Das igrejas de Nossa Senhora do Rosário e de Nossa Senhora da Conceição, estão sendo restauradas as imagens de Santa Efigênia, São José de Botas, Cristo Crucificado (duas), Jesus Menino, Cristo Morto (articulado), São Vicente Ferrer, Nossa Senhora da Conceição, Nossa Senhora do Rosário, uma peanha (base de imagem) e uma cartela (peça de madeira entalhada). Na igreja de Nossa Senhora do Rosário foi feita a recuperação do telhado.

PRESERVAÇÃO No ateliê, estão também as imagens da capela de Nossa Senhora de Bonsucesso, do distrito de Bonsucesso: a padroeira, Nossa Senhora da Conceição, e São Sebastião. A coordenadora da restauração, Josiane Figueiredo, diz que o objetivo é restaurar as peças sem retirar as características originais. “Vamos atender um pedido dos moradores dos distritos. Mesmo que repinturas escondam douramentos, vamos manter as peças do jeito que a comunidade as conhece. A devoção é muito grande, tanto que os fiéis vêm a Belo Horizonte para ver o restauro. Dessa forma, não queremos que uma intervenção cause estranhamento ou falsifique o objeto sacro. Isso é um desejo da comunidade”, afirma Josiane, que tem na equipe a restauradora Moema Nascimento e as assistentes de restauro Marcília Gomes Tavares e Angelita Angélica Matos Teixeira. (GW)

IEPHA

Ao saber do resultado da pesquisa do restaurador José Efigênio Pinto Coelho, de Ouro Preto, a diretora de Proteção e Memória do Iepha/MG, Maria Marta Martins de Araújo, diz que são necessárias mais informações para ter uma posição sobre o assunto. Mesmo assim, afirmou, a equipe do Iepha vai tomar conhecimento dos fundamentos e analisar os critérios usados pelo restaurador para chegar a essa conclusão

PASSOS DE ALEIJADINHO EM BH

PATRIMÔNIO
Passos de Aleijadinho em BH
Especialista identifica em entalhes do chafariz da Catedral de N. S. da Boa Viagem, em BH, traços característicos do mestre do barroco e atribui peça ao artista mais famoso do período
Gustavo Werneck
Fotos: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press
Descoberta polêmica e surpreendente pode incluir Belo Horizonte na lista das cidades mineiras com a marca de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814). Depois de anos de pesquisa, o restaurador José Efigênio Pinto Coelho, de Ouro Preto, concluiu que o chafariz de pedra-sabão existente no interior da Catedral de Nossa Senhora da Boa Viagem, no Centro da capital, é atribuído ao mestre do barroco. A peça datada de 1793, com 2,64 metros de altura e 1,11m de largura, teria pertencido à primitiva matriz em louvor à santa construída nos tempos do Curral del-Rei e demolida no início do século 20 para dar lugar à catedral. “BH, uma cidade republicana por excelência, mostra agora um traço colonial”, diz o restaurador.

Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em 1960, e pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), em 1977, o chafariz, de autor desconhecido, fica no corredor da igreja, do lado direito. No seu lugar original, na parte externa, pode ser vista uma cópia de cimento. Antes de retornar definitivamente ao interior da catedral, na década de 1990, a peça esteve no Museu Histórico Abílio Barreto, ao qual foi doada, pela Cúria, em 1942, embora só tenha seguido para o prédio da Cidade Jardim quatro décadas depois. Restaurado, ele recebe atenção permanente da equipe do museu.

Há duas hipóteses, segundo José Efigênio, para o chafariz, inicialmente usado como lavabo na antiga Igreja da Boa Viagem, ter chegado a BH: pode ter sido encomendado a Aleijadinho, em uma época em que ele estava em grande atividade e o arraial, em crescimento econômico, ou ter sido trazido de Ouro Preto durante a mudança da capital, em 1897. O que importa, para o restaurador, são as evidências: “A data (1793) existente no alto do chafariz da Catedral da Boa Viagem tem semelhança com os recibos escritos por Aleijadinho em Congonhas, onde fez os 12 profetas, entre 1795 a 1805. Os números trazem, entre eles, três pontos bem marcados, um símbolo da maçonaria presente em sua obra”.

Detalhes como a data esculpida na peça fundamentam conclusão do restaurador. Ele relaciona outros elementos que, diz, não deixam dúvida quanto à autoria da obra
SEMELHANÇAS
Nas suas análises, José Efigênio, que atua como expertise – especialista com autoridade para atestar a veracidade e periciar obras de arte –, descobriu que a matéria-prima do chafariz, a pedra-sabão, é proveniente do distrito de Santa Rita, em Ouro Preto, onde Aleijadinho se abastecia regularmente para dar forma ao seu trabalho. O material – esteatito com carbonatos disseminados e alterados, o que dá a cor amarelada – está presente também nas ornamentações da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, de Ouro Preto, e de São Francisco de Assis, em São João del-Rei, no Campo das Vertentes.

Segundo o restaurador, que diz conhecer a peça da Boa Viagem há mais de 30 anos e estudar a pedra-sabão há 20, Aleijadinho esculpiu três chafarizes já reconhecidos como de sua autoria: os das igrejas de São Francisco de Assis (1777) e de Nossa Senhora do Carmo (1776), em Ouro Preto, e a Fonte da Samaritana (1792), que ficava no pátio do Seminário da Boa Morte, em Mariana, e hoje está na entrada do Museu Arquidiocesano de Arte Sacra da cidade.

“Não acredito em uma ‘escola Aleijadinho’ ou em discípulos do mestre. Só mesmo o genial Antonio Francisco Lisboa poderia ter criado essa peça”, afirma. Para ele, o chafariz da catedral tem a leveza da fase plena do mestre e guarda muita semelhança com o chafariz da sacristia da Igreja de Nossa Senhora do Carmo.

“O desenho do coroamento é o mesmo. As cabeças das duas figuras, no chafariz de BH, são as mesmas encontradas no chafariz do Carmo. A boca de peixe que se parece com a de um pato, os círculos nos olhos e as orelhas da peça da Boa Viagem lembram também as dos leões do Museu do Aleijadinho, de Ouro Preto, colocadas de modo inusitado e criativo. O peixe ou cobra com orelhas saiu das mãos do mestre e de mais ninguém do Ciclo do Ouro, pois só ele criava”, afirma o restaurador, que já fez um laudo e o registrou em cartório de Ouro Preto, onde mora.